Não tenho vidas paralelas, paralelo-me, e cada coisa a seu modo e a seu tempo tem a meu respeito uma visão. É certo que minhas plantas nutrem hoje por mim muito mais carinho do que sobrou em outro. E é certo também que eu guardo por elas exímia admiração. Estão sempre a sorrir e sempre, sempre à disposição para um toque sincero.
16 de out. de 2010
Achei por bem trocar as toalhas do criado mudo e da mesa de centro. Crochê branco para um. Fuxicos tons vermelhos para a outra. Guardei os enfeites de roxo que não se davam com o vermelho. Fervi água para um chá verde. Me senti como se precisasse de uma companhia imóvel. Abri o guarda-roupa de brinquedos. Olhei uma a uma as bonecas ansiosas. Relutei mas não tive escolha. Margarida Gautier me acompanhará mais um dia. Da minha imensa janela vejo toda uma face. Nordeste. Passa o longo fura-fila amarelo, que aprendi a gostar. Uma paisagem feia que de tão grandiosa traz um não-sei-o-quê de também grandioso, e fica bela também. Olho para a varanda e imagino projetos. Árvores, bancos, até um riozinho podia ter. Eu queria deitar na grama da minha varanda e ouvir os pássaros, mas eles bateriam nos vidros semi-zonzos. Queria calar as buzinas e motores. Queria a brisa fria. Mas vou tomar meu chá e cuidar de Gautier. Antes, vou pendurar um passarinho no lustre.
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